segunda-feira, 10 de dezembro de 2007

Olha, uma borboleta!

Era negra como a noite;
e o gesto brando com que, uma vez posta, começou a mover as asas,
tinha um certo ar escarninho, uma espécie de ironia mefistofélica, que me aborreceu muito.
Dei de ombros, saí do quarto; mas tornando lá, minutos depois, e achando-a ainda no mesmo lugar, senti um repelão dos nervos, lancei mão de uma toalha, bati-lhe e ela caiu.
Não caiu morta; ainda torcia o corpo e movia as farpinhas da cabeça. Apiedei-me; tomei-a na palma da mão e fui depôla no peitoril da janela. Era tarde; a infeliz expirou dentro de alguns segundos.
Fiquei um pouco aborrecido, incomodado.

- Também por que diabo não era ela azul? disse eu comigo.

E esta reflexão, - uma das mais profundas que se tem feito desde a invenção das borboletas, -
me consolou do malefício, e me reconciliou comigo mesmo.
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Machado

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